DESABAFO DE UM AUTOENTUSIASTA

Post feito para o blog AUTOentusiastas.

Carro não!?
Mais ou menos há uns quatro anos meu pai, que fumou feito uma chaminé a vida inteira, parou de fumar. Apesar do BS afirmar que o cigarro não mata (o que de certa forma não está errado) eu fiquei muito feliz. Mas ele não parou de fumar por causa da saúde. Sua explicação foi que o cerco ao tabagismo ficou tão apertado que o desconforto de fumar ultrapassou o prazer que o fumo proporciona. Nesse caso, a demonização do cigarro e a estratégia dos antitabagistas deu certo. Mas o senso comum, principalmente de quem não fuma, é de que o cigarro no mínimo seria dispensável.

Isso me fez pensar sobre o que estão fazendo com os carros nas grandes cidades como São Paulo e não só no Brasil. Hoje em dia estão querendo nos fazer sentir culpados por andar de carro, ou com medo! Há vários posts aqui no AE, principalmente do BS, sobre a incapacidade dos governantes em melhoras a cidade sem que seja em detrimento dos que usam carros. Isso sem falar que quem usa carro contribui substancialmente com impostos e com a manutenção do nível de empregos. Então, esse cerco, como o próprio BS já disse, é um tiro no pé. Sem contar que o carro sozinho não mata e há tempos não faz mais mal à saúde. 

Demônios enjaulados!!!


Desde de meados de setembro do ano passado, por uma circunstância, estou sem carro próprio e desde então estou enrolando um pouco para comprar outro. Felizmente moro numa região boa, com acesso a tudo que preciso bem perto de casa e consigo viver sem carro, mas não sei até quando. E quando necessário minha esposa usa o carro do meu sogro. 

Entre outros motivos para minha enrolação estão estão o IPVA, o seguro, e a chatice que é andar de carro em São Paulo. Além do trânsito insuportável, há os radares, os novos corredores de ônibus, os motoboys malucos, as ciclovias, as vias esburacadas, a falta de estacionamento pago e não pago, e a total falta de sincronização dos sinais. Fora isso o medo se sofrer um seqüestro relâmpago.

Um semáforo a cada 200 metros

Nesse começo de ano, com a cidade vazia e quase todos esses fatores resolvidos pela simples diminuição significativa dos motoristas, cheguei até a pedir que o trânsito voltasse. Será que fiquei doido?

Não mesmo. Da minha casa até a casa do meu sogro não são mais que cinco quilômetros. Mas descobri que levo quase o mesmo tempo com ou sem trânsito devido a quantidade fenomenal de sinais quase sempre fechados. E não tem nada pior que ficar parado num semáforo, vendo o tempo passar e sem quase ninguém na rua. É a mesma coisa que ficar na frente do computador assistindo o Windows abrir, o antivírus se preparar e o programas carregarem até efetivamente se conseguir usar a máquina. 

O problema não são os carros e sim o excesso de gente numa cidade mal planejada

Então eu estou aproveitando esse tempo sem carro para tentar me virar da melhor forma possível. Vale notar que estou com total disponibilidade de tempo e praticamente posso chegar onde quero só dependendo de ajustar a hora da saída conforme o transporte. Sei que isso não reflete a maioria das pessoas com rotinas apertadas. 

Sempre que viajo ao exterior uma das coisas que eu invejo são as pessoas poderem realmente usar uma bicicleta para transporte. Em Paris, Tóquio, São Francisco, Munique e outras cidades que ainda não visitei, assim como em muitas cidades pequenas e médias do Brasil, as bicicletas estão realmente integradas ao transporte. A bicicleta tem uma série de desvantagens sobre outros transportes que vão desde a necessidade de um local seguro e apropriado para guardá-la no destino, impossibilidade de uso em dias de chuva, necessidade de roupas leves, entre outras. Mas como quando menino eu andava muito de bicicleta e comecei a namorar minha esposa indo ao seu encontro de Caloi Ceci da minha irmã, realmente gosto de pedalar. Mas sempre tive receio de pedalar no trânsito agressivo de São Paulo.

Bicicleta; eu gosto

Eis que em São Paulo e mais outras cidades do Brasil surgiram essas bicicletas laranjas patrocinadas pelo Banco Itaú. Durante meses eu as vi andando pra lá e pra cá mas não venci o receio pela insegurança. Porém, ficar sem carro foi o estímulo que eu precisava. Para utilizá-las é muito fácil. Basta fazer um cadastro e pagar um depósito de apenas 10 reais. Por telefone ou através de um aplicativo para smartphones você desbloqueia as bicicletas na estação desejada, que pode ser localizada pelo app que também informa a disponibilidade e número de vagas vazias. Se a utilização ultrapassar 30 minutos paga-se 5 reais para cada 30 minutos adicionais. Notícia recente é que agora o prazo para a primeira cobrança é de uma hora e é possível a utilização com Bilhete Único de transporte.

As bicicletas são bem confortáveis com selim ajustável e três marchas, embutidas no cubo da roda traseira. A manutenção até que é boa mas poderia ser melhor. Alguns usuários realmente fazem jus à sua falta de educação e cuidado com o que é de todos e acabam detonando as bicicletas. Algumas estações, principalmente próximas a faculdades, também estão bem detonadas e as vezes a bicicleta não destrava. Isso é chato, pois nos faz ligar para a central (o atendimento é muito bom) e perder um tempão ou até ter que procurar outra estação. Dá um certo trabalho e se tiver hora marcada é melhor sair com bastante antecedência e saber que pode precisar caminhar ou pegar um táxi. Com mais de um ano de operação já está na hora de uma reforma geral nas estações e bikes.

Londres, na faixa de ônibus. E eles não andam devagar!

Londres, no meio dos carros

Graz, ao lado do bonde

Paris, na contramão

São Francisco, bem no meio da rua

São Paulo, perigos além dos carros

E o trânsito? Bem, para minha grata surpresa não é que o motorista, aquele ser marginalizado que usa carro, está bem mais manso. Eu sempre achei os ciclistas muito folgados e até sem juízo ao tentarem enfrentar carros, caminhões e ônibus na marra. O motorista brasileiro não tem a cultura de respeitar ninguém e muitos ciclistas se acham no direito de andar no meio dos carros, em vias expressas e de forma irresponsável só por acharem que estão prestando um serviço para a sociedade ao não usarem carros. Claro que isso não pode ser generalizado e existem muitos bons ciclistas. Mas eu sinto um ar de desafio em muitos deles. E os motoristas, "marginais"', em caso de acidente, independente da imprudência de um ciclista, podem ser sempre vilões. Acontece isso com motoboys também, de uma maneira muito pior. Então acho que os motoristas estão aceitando que não haverá outro jeito a não ser conviver com os ciclistas (bons e ruins) e assim estão mais atentos e os respeitando muito mais. Acho também que viagens ao exterior, onde se fizer besteira paga-se a multa na hora ou vai preso, estão ajudado alguns motoristas a se reeducar. Afirmo isso pois é o meu caso. 

Na minha última viagem a Londres, no ano passado, fiquei impressionado como os ciclistas se metem realmente no meio do trânsito, em espaços totalmente inseguros, cruzando na frente dos doubledeckers, sem o menor respeito aos motoristas. Então acho bom que quem ainda não respeita os ciclistas, começar a respeitar pois o caminho é sem volta e nós vamos aprender na marra mesmo. 

Usei muito as bicicletas fazendo integração com o metrô, que há tempos não usava, e com muitos trechos a pé. Funcionou muito bem, economizei muito em combustível e estacionamento além de até ter emagreçido bem. Também tive mais contato com a cidade e o povo percebendo como o consumo de tudo está bem forte através de muita publicidade nas estações e dentro dos trens do metrô. E exercitei muito meu hobby de fotografia de rua, impossível de praticar estando de carro. Ônibus eu não peguei e nem quero pegar tamanho é o desconforto físico e auditivo. Diferente do metrô, os ônibus são o que há de mais terrível em São Paulo.  

Andar a pé é bem legal e às vezes chegamos ao destino antes do que de carro

Além dos semáforos e radares outra coisa que realmente me entristece e tira o prazer de ter um carro bacana (diga-se um pouco mais esportivo) é a qualidade das vias de rodagem. A buraqueira e a total incompetência técnica de que constrói e muito mais, de quem repara nossas ruas, é absurda. É remendo em cima de remendo, asfalto sobre concreto, tampas de bueiro rebaixadas formando verdadeiros cantos vivos, valetas e lombadas totalmente fora de padrão e propósito e ruas abauladas com centro da via de rodagem mais alto que as calçadas de tanto recapeamento feito. Tem certos bairros onde realmente é melhor andar a pé! Até de bicicleta é ruim, de tanto buraco.




Fotos do protesto Buracos de Sampa

Isso me irritou tanto da última vez que dirigi um esportivo, e agora avaliando um Golf GTI, que me fez fazer um protesto contra a buraqueira e a condição de nossas vias.

Veja mais buracos de São Paulo em Buracos de Sampa.

O carro ainda tem qualidades imbatíveis como o conforto do isolamento e a versatilidade. Mas a sensação de liberdade, ao menos no trânsito das grandes cidades, se foi. Não dá para todo mundo querer ser livre ao mesmo tempo num espaço reduzido! E ao poucos sua demonização está dando certo. Tanto que muitos jovens de países desenvolvidos, que tem transporte público de primeira, não se interessam por carros. E na era da informação, a necessidade de ir e vir está diminuindo substancialmente.

Mas, concluindo, depois de usar as bicicletas, metrô e muita sola de sapato por três meses, acabei cansando um pouco e não hesitei em usar o carro do meu sogro ou os de testes sempre que estivessem disponíveis. Acho que o dia em que vou querer parar de usar um carro, bem diferente do que aconteceu com meu pai ao parar de fumar, nunca vai chegar. Apesar de que no dia a dia de São Paulo o prazer já se foi.


Abraço
PK

Nenhum comentário: