BANGALORE, ÍNDIA



Post original feito para o blog AUTOentusiastas.

Um dos motivos pelo qual eu ando participando pouco no blog ultimamente é que eu tenho viajado bastante. Uma dessas viagens foi para um destino inesperado, Bangalore, na Índia.

Bangalore fica bem ao sul do país e é a terceira cidade mais populosa da Índia, logo atrás de Deli e Bombaim. Para os entusiastas, a cidade de Nova Deli, que fica em Deli, é conhecida pelo salão internacional do automóvel que se realiza a cada dois anos. Mas é em Bangalore que fica o “Vale do Silício” indiano, um polo de tecnologia que abriga empresas e instituições de pesquisa no campo da tecnologia da informação. Bangalore também é um dos polos econômicos e culturais da Índia.

foto: Wikipedia

Dando uma surfada na internet pode-se encontrar fotos maravilhosas de Bangalore. Minha estadia lá foi curta e não tive tempo de procurar lugares e situações que retratassem a beleza do local. Por onde andei vi cenários muito diferentes. Para falar a verdade, o que eu vi não foi nada muito bonito. Prédios e casas caindo aos pedaços, calçadas completamente destruídas, sujeira em todo lugar e muitas obras. Essas obras sinalizam o crescimento econômico. Mas são obras feitas sem tecnologia nenhuma, tanto em propriedades particulares como nas obras viárias. Para se ter uma ideia, as estruturas dos andaimes são de madeira, e não de tudos metálicos. Tudo de baixíssimo custo.


Autoescola em um bairro da periferia

A cidade está um grande canteiro de obras para a construção de um metrô de superfície, na verdade elevado. E a organização e sinalização das obras são praticamente inexistentes.

Bangalore é muito arborizada, muito mais que São Paulo, e isso disfarça um pouco a feiúra das construções. Vale notar que existem construções antigas, como sedes do governo, teatros, bibliotecas e os templos, que são lindíssimos. Mas no geral é tudo muito sujo nos arredores. A população é muito pobre.


Obras e demolições por todo lado

Mas foi o povo o que mais me chamou a atenção. A grande maioria é hindu praticante e visita os templos, pequenos, espalhados pela cidade. Muitos andam com uma marca vermelha no meio da testa. Pelo que pude entender é como se fosse uma benção, tipo água benta para os católicos. Quando parei num templo vi uma moto sendo benta com uma marca feita na carenagem do farol com o mesmo pó que se usa para marcar a testa. Talvez por causa da religião, o povo seja pacato.


Andei por lugares que aqui no Brasil não me arriscaria nem a chegar perto. De alguma maneira me senti muito seguro. Posso ter corrido riscos sem saber, pois não estava com nenhum local para me dar as dicas. As pessoas não o encaram na rua e quando você as olha com um ar amigável elas retribuem com sorrisos e um ar de interesse pelo estrangeiro. Tendo sido uma colônia inglesa, a maioria da população fala inglês, meio difícil, mas dá para se entender.


Minha impressão é que o Brasil está uns 20 anos à frente em desenvolvimento. Mas isso se eu considerar São Paulo e as principais capitais. Voltei de lá com um olhar mais crítico e percebi que ando cercado por favelas e bairros da periferia que não são diferentes dos que vi em Bangalore. Mas por aqui as classes mais altas sobressaem mais nas grandes cidades. Me perguntei se o Brasil seria diferente do que é hoje se tivesse sido colônia inglesa. Talvez não. Ao menos a mão seria invertida, como na Índia.


Bem, essa introdução saiu bem maior do que eu imaginava. Então vamos aos carros.

Logo ao sair do aeroporto pegamos um táxi para uma viagem de uma hora até a cidade. O carro foi uma minivan da Toyota, a Innova, feita na plataforma da Hilux. Uma construção pouco usual, mas que funciona bem. Motor 4-cilindros 2.7-litros a gasolina, tração traseira e eixo rígido atrás, mas com molas helicoidais (a Hilux usa feixe de molas). Por dentro são sete lugares e tudo bem básico, mas funcional. São sete lugares e o conforto de rodagem é muito bom. Aqui no Brasil muita gente torceria o nariz para esse carro, pois o desenho não é lá essas coisas. Mas para quem precisa de espaço e robustez seria uma grande pedida.


Toyota Innova

Pegamos um trânsito intenso e muito desorganizado. Os motoristas simplesmente não andam no meio das faixas. É como se elas não existissem, uma zona total! E outra particularidade é o uso constante da buzina. A qualquer sinal de aproximação de outro carro com possibilidade de colisão ou não, a buzina é acionada. Chega a ser irritante para nós que não estamos acostumados. Mas a buzina não é usada com irritação ou num tom agressivo. Não vi nenhum xingamento ou nervosismo mesmo nos congestionamentos mais intensos. O pessoal se entende no meio daquela zona. Não me senti inseguro. Já por aqui, além da zona que temos em alguns lugares, o pessoal é muito irritado no trânsito e se estressa demais.


Trânsito caótico, mas sem estresse

A segurança não vai muito além dos dizeres nas placas:
"velocidade mata,  melhor atrasado do que nunca"
e "velocidade excita, mas mata"

No para-choque traseiro de um caminhão: buzine

No ano passado nos gabamos de ter sido o quarto maior mercado de automóveis do mundo. Mas em 2011 a Índia nos passou. E o país tem um destaque muito grande no cenário mundial, pois tem uma população seis vezes maior que a do Brasil. São 1,2 bilhão de habitantes! E a Índia tem algo que não temos: indústria nacional. Tata, Mahindra e a primeira fabricante local, a Hindustan, são todas empresas indianas, que fazem carros e veículos comerciais de acordo com as necessidades locais.

A Maruti, que era indiana, hoje é uma subsidiária da Suzuki com participação de investidores indianos e se chama Maruti/Suzuki. Produz e vende modelos Suzuki além de vender o Renault Logan. Alguns modelos projetados e desenvolvidos na Índia, como o novo Tata Manza, já estão alcançando classe mundial. E a Tata também é dona da Jaguar e da Land Rover.


Tata Manza, indústria local

Mahindra Scorpio, indústria local

A maioria dos carros, como no Brasil, é de hatches pequenos sendo, que os mais vistos são Maruti/Suzuki (líder de vendas), Tata, e Hyundai. A Hyundai está crescendo muito com um política de modelos modernos a preço baixo, assim como no Brasil. Mas lá os modelos mais vendiddos são o I10 e o I20. Há muitos modelos mais novos rodando, mas a maioria é de carros mais antigos. Fiat Linea, VW Polo e Skoda Laura, por exemplo, parecem carros de alto luxo. Tive a chance de ver um Chevrolet Cruze, também um modelo de luxo.


Hyundai I10

Hyundai I20

Fiat Palio, A Fiat tem parceria com a Tata

Maruti/Suzuki Wagon R

Skoda Fabia, os Skodas parecem mais luxuosos nas ruas de Bangalore

Chevrolet Cruze, um carrão para o padrão indiano

Mas são as motos que dominam as ruas. Elas são o transporte preferido para avançar no trânsito caótico. São de baixa cilindrada, a maioria Honda de 125 cm³. Levam até quatro passageiros e segurança não é importante. Capacete quase não é usado para o garupa assim como calçados apropriados. Há muitos scooters também. E o buzinaço é constante. Muito pior que os motoboys de São Paulo.


Depois das motos o jeito mais rápido de se deslocar é pegando um táxi auto-rickshaw. São triciclos com mecânica de scooters, motor dois-tempos, que levam até três passageiros e infestam as ruas. São muito baratos e práticos, pois os seus motoristas sabem bem avançar entre os carros e se deslocar com destreza no meio do trânsito. Olhando de fora parece algo muito inseguro. E de fato são inseguros, mas incrivelmente não dá medo de andar neles. Como eu disse, lá o trânsito não é agressivo. O pessoal se entende numa boa, sem estresse. Me diverti andando muito nesses bichinhos.


Fato curioso é que tentaram vender essas coisinhas aqui no Brasil. Acho que em cidades do interior até que vai, mas é um erro achar que apesar das semelhanças de mercado/consumo entre Brasil e Índia o que é sucesso lá pode ser sucesso aqui também. As diferenças sócio-culturais são muito grandes. Outro exemplo são os utilitários da Mahindra, também sucesso na Índia, mas dificílimos de vender aqui, mesmo a preços baixos.


Cheguei lá super curioso para ver o Tata Nano (saiba mais sobre o Nano), o carro mais barato do mundo, rodando nas ruas de Bangalore. Procurei, procurei, procurei, e nada! Cadê o Nano? Pude ver apenas uns cinco ou seis nas ruas. E como os vi de surpresa, mal consegui fotografá-los. Pelo que tenho acompanhado, as vendas do ovinho não decolaram como a Tata esperava. Além de um problema técnico que causou incêndios de algumas unidades, o esquema de financiamento proposto inicialmente não foi suficiente para fazer os usuários de motocicletas migrarem para o Nano. Essa era a proposta inicial da Tata, substituir motos e scooters para aqueles que os usam para o transporte familiar. Mas me parece que o pessoal gosta mesmo é das motos, pela praticidade.


Tata Nano e seus concorrentes

Outro modelo que eu tinha curiosidade em conhecer é o famoso Hindustan Ambassador. Esse carro é basicamente um Morris Oxford, motor dianteiro e tração traseira, da década de 40 que é feito na Índia desde 1948 até hoje com pouquíssimas alterações. Mas também para minha surpresa quase não o vi nas ruas. A maioria dos que vi é do governo, facilmente identificáveis através de um adorno no capô.


Hindustan Ambassador, um Morris Oxford 1948 fabricado até hoje

Os utilitários da Mahindra são populares e utilizados pela polícia local. Lá, alguns modelos mais novos, como o Scorpio, chegam até a parecerem carros de luxo.


Mahindra Scorpio, carro de polícia

Um outro ponto importante que notei principalmente na publicidade local e também no hotel em que me hospedei é a preocupação com o meio ambiente. Achei realmente estranho isso num local onde ainda faltam condições básicas de sobrevivência. Talvez seja apenas marketing! Mas o fato é que vi alguns carros elétricos Reva rodando em Bangalore. Um deles com um adesivo escrito emissions impossible – emissões impossíveis. Descobri que a Reva é uma empresa indiana também, com sede em Bangalore. Em 2010 a Mahindra comprou a Reva. O Reva G-Wiz é vendido na Inglaterra e foi ridicularizado pelo showman do Top Gear. Alias, mais uma coisa que a Índia tem que nós não temos, a transmissão do Top Gear.


Reva, também fruto da indústria local

Os caminhões e ônibus são muito antigos. Alguns, apesar de velhos, são bem cuidados, mas outros andam em estado precário. Mas todos são muito coloridos e alegres.


No geral não senti que o indiano seja um fanático por carros como os brasileiros. Não senti nenhuma pitada de autoentusiasmo nas ruas e não vi modelos esportivos ou muito interessantes. O Brasil me parece estar muito à frente da Índia em desenvolvimento. Mas numa visita aos meus pais, que moram na praia de Pernambuco no Guarujá, passei por lugares idênticos aos que visitei na Índia. Talvez por estar acostumado com favelas e pontos de pobreza, por onde ando normalmente, eu nem os perceba mais. Embora existam muitas semelhanças, as culturas são muito diferentes. Ambos países ainda tem um longo caminho pela frente, cada um com as suas particularidades. O Brasil já mais maduro e a Índia com uma população gigantesca.


PK

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